A crucificação de Jesus Cristo é narrada nos quatro evangelhos, dando-nos um quadro completo do que ocorreu e registrando as frases que Ele proferiu naquela ocasião.
É uma tradição antiga da Igreja que pregadores nos falem sobre o tema, de forma a que possamos refletir e mergulhar na espiritualidade dessas frases, que são conhecidas como as "Sete Palavras".
Primeira Palavra: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23, 34)
Pai – é o mais suave título de Deus. Nessa hora extrema, Jesus bem poderia invocá-Lo chamando-O Deus. Percebe-se, entretanto, claramente a intenção do Redentor: quis afastar, dos que o condenaram, a severidade do Juiz Supremo, pedindo a Sua a misericórdia a eles.
É a primeira “palavra” que Seus lábios pronunciam na cruz, e nela já encontramos o perdão. Perdão pelos que Lhe infligiram diretamente seu martírio. Perdão que abarca também todos os outros culpados: os pecadores. Nesse momento, portanto, Jesus pediu ao Pai também por cada um de nós.
Embora não houvesse fundamento para perdoar a ingratidão do povo e o ódio dos algozes, a inveja e ódio dos príncipes e sacerdotes, tão infinita foi a Caridade de Jesus que Ele diria ao Pai: “porque não sabem o que fazem.”
Segunda Palavra: “Em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso (Lc 23, 43)
A cena não podia ser mais pungente. Jesus se encontra entre dois ladrões. Um deles faz jus à afirmação da Escritura: “Um abismo atrai outro abismo (SL 41,8). Blasfema contra Jesus, dizendo: “Se és Cristo, salva-te a ti mesmo, e salva-nos a nós” (Lc 23, 39).
Enquanto esse ladrão ofende, o outro louva Jesus e admoesta seu companheiro, dizendo: “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres do mesmo suplício? Para nós isto é justo: recebemos o que merecemos por nossos crimes, mas este não fez mal algum” (Lc 23, 40-41).
São palavras inspiradas, nas quais transparecem a santa correção fraterna, o reconhecimento da inocência de Cristo, a confissão arrependida dos crimes cometidos. São virtudes que lhe preparam a alma para uma ousada súplica: “Senhor, lembra-te de mim, quando tiveres entrado no teu Reino!” (Lc. 23, 42).
Ao referir-se a Jesus enquanto “Senhor“, Dimas, um dos ladrões, reconhece-O como Redentor. Tal gesto lhe fez merecer de Jesus este prêmio: “Em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23, 43).
Terceira Palavra: Jesus disse à sua mãe: “Mulher, eis aí teu filho”. Depois disse ao discípulo que estava ao pé da cruz: “Eis aí tua Mãe”. E dessa hora em diante o discípulo a levou para a sua casa” (Jo 19, 25-27)
Essas palavras foram ouvidas por Maria Madalena, Maria, mulher de Cleófas, Maria Santíssima e João, o evangelista.
É arrebatador constatar como Jesus no auge da dor, expressou o carinho de um Deus por sua Mãe Santíssima, e concedeu o prêmio para o discípulo que abandonara seus próprios pais para segui-Lo: receberá muito. (Mt 19, 29).
É perfeita e exemplar a presteza com que João assume a herança deixada pelo Divino Mestre: “E dessa hora em diante, o discípulo a levou para a sua casa” (Jo 19, 27), cuidando de Maria até o fim de sua vida, como já contamos em outro post.
Quarta Palavra: “Meu Deus, meu Deus, por que Me abandonaste? (Mt 27, 45)
Jesus clama em alta voz, mas não profere uma queixa, nem faz uma acusação. Deseja, por amor a nós, fazer-nos entender a intensidade de seus tormentos. Assim podemos adquirir uma clara noção de quanto pesam nossos pecados e de quanto devemos ser agradecidos pela Redenção.
Mas a Natureza, reconhecendo a monstruosidade do que acontecia, reagiu: “cobriu-se toda a terra de trevas” … (Mt 27, 45).
Quinta Palavra: “Tenho sede” (Jo 19, 28)
Quando Jesus disse essas palavras, os soldados, vendo um vaso cheio de vinagre que havia por ali, embeberam uma esponja, “e fixando-a numa vara, chegaram-lhe à boca” (Jo 19, 28-29).
Cumpria-se assim o versículo 22 do salmo 68: “Puseram fel no meu alimento; na minha sede deram-me vinagre para beber.”
E como podemos aliviar esse sofrimento de Jesus?
Podemos de alguma maneira aliviar pelo menos esse tormento de Jesus? Sim, compadecendo-nos d’Ele com amor e verdadeira piedade, e apresentando-Lhe um coração arrependido e humilhado.
Devemos querer ter parte nessa sede de Cristo, almejando a nossa própria santificação, com redobrado esforço, de modo a não pensar, desejar ou praticar algo que d'Ele nos afaste.
Sexta Palavra: “Tudo está consumado” (Jo 19, 30)
Jesus morrera. Todas as profecias haviam se cumprido, conforme nos diz Santo Agostinho: a concepção virginal (Is 7, 14); o nascimento em Belém (Mq 5, 1); a adoração dos Reis (Sl 71, 10); a pregação e os milagres (Is 61, 1; 35, 5-6); a gloriosa entrada em Jerusalém no dia de Ramos (Zc 9, 9) e toda a Paixão (Isaías e Jeremias).
Consumado também estava o edifício da Igreja. Este iniciou-se com o batismo no Jordão, onde foi ouvida a voz do Pai indicando seu Filho muito amado, e se concluiu na cruz, na qual Jesus adquiriu todas as graças que serão distribuídas até o fim do mundo através dos sacramentos.
Sétima Palavra: “Pai, nas tuas mãos, entrego o meu espírito” (Lc 23, 46)
Estabeleceu-se na Igreja, desde os primórdios, o costume de encomendar as almas dos fiéis defuntos, a fim de que a luz perpétua os ilumine.
Jesus, porém, não tinha necessidade de encomendar sua alma ao Pai, pois desde o primeiro instante de sua existência, ela encontrava-se unida à natureza divina na pessoa do Verbo.
Mas, Jesus aguardava sua ressurreição para logo. Ao entregar ao Pai a vida que d’Ele recebera, sabia que ela Lhe seria restituída no tempo devido.
Com reverência tomou o Pai Eterno em suas mãos a vida de seu Filho unigênito, e com infinito comprazimento a devolveu, no ato da ressurreição, a um corpo imortal, impassível e glorioso. Abriu-se, assim, o caminho para a nossa ressurreição, ficando-nos a lição de que ela não pode ser atingida senão pelo calvário e pela cruz.
Reflitamos sobre tudo isso.